
Um excelente romance (na realidade não sei se se pode classificar como simples romance...), um livro muito invulgar na sua estrutura. História ficcionada e realidade vão-se cruzando e misturando, alternando, confundindo-se lado a lado, o que até nem é novo. Mas este livro leva essa possibilidade ao extremo, sobretudo porque é uma realidade mesmo concreta, em que há o próprio escritor, há "personagens" mesmo reais, da nossa sociedade, desde Mandela a Mia Couto, e há referências nítidas às suas próprias vivências enquanto pessoa, desde músicas, a filmes e passagens da sua própria vida. Penso que será certamente o primeiro e único livro que irei ler e que trará uma menção e comentário a uma reportagem da revista Pública, junto com uma receita de Frango à Zambeziana...
José Eduardo Agualusa atinge uma maturidade de escrita muito consolidada, existindo uma evidente aproximação e colagem ao estilo de Mia Couto, não tanto na escrita em si, porque essa será inigualável, mas sobretudo no aspecto ficcional, nos universos mágicos e místicos que consegue criar, na irrealidade das personagens, na criação de um mundo onde pessoas vivem lado a lado com criaturas fantásticas e experiências esotéricas, um mundo de "sonambulância" constante. Depois, é um livro essencialmente sobre a vida de um homem, um músico angolano, Faustino Manso, mas será apenas esse um pretexto para o verdadeiro tema, as mulheres e o seu mundo, as suas relações com esse homem, as suas características únicas, numa perspectiva africana de um continente renascido mas com muitos vícios e problemas difíceis ainda por resolver. Um livro que dá imenso prazer ler, que se recomenda vivamente.
"Sentei-me ao seu lado, em silêncio e dessa vez foi ela quem falou primeiro. - Leve os sonhos a sério - sussurrou. - Nada é tão verdadeiro que não mereça ser inventado."
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